O mês da sopa

Sopa de feijão, couve e milho

Eu poderia tomar sopa todos os dias sem nunca reclamar. Na verdade isso até me deixaria bem feliz. Mas a outra moradora da casa não divide minha empolgação com sopas. Ela gosta, sempre limpa o prato, mas nunca proclamou “Que vontade de tomar sopa hoje!”. Se tiver, ela toma, mas se puder escolher, ela escolhe outra coisa. Pra mim não tem criação culinária mais perfeita do que sopa. Ela é generosa e acolhe os mais diferentes tipos de verduras, leguminosas, cereais e ervas. Ela é democrática e aceita tanto os ingredientes mais humildes quanto os mais requintados.  Ela é econômica e transforma alguns punhados de alimentos em jantar pra várias pessoas. Ela não faz bagunça na cozinha, você só precisa de uma faca, uma tabua de legumes e uma panela. Ela recicla os restos. Ela oferece muitos nutrientes e poucas calorias (as minhas sopas, pelo menos). Ela aquece o corpo por dentro e reconforta. Não consigo entender gente que não gosta de sopa.

Como a senhora papacapim está atualmente em Gaza, onde vai passar um mês inteiro trabalhando, estou aproveitando que sou a única moradora da casa pra curtir alguns prazeres solitários. Não, não é o que você está pensando. Tento espantar a solidão fazendo coisinhas que agradam mais a mim do que a ela. Rever Dirty Dancing e o Rei Leão. Comer espinafre três vezes por dia. Tomar sopa todas as noites. Eu não sou muito difícil de agradar…

Sopas de feijão são minhas preferidas e posso preparar inúmeras versões.  Sempre começo a construir a receita a partir do feijão que tiver na cozinha. Em seguida abro a geladeira à procura dos vegetais disponíveis e escolho os que combinarem melhor com o tipo de feijão (quando a geladeira está quase vazia sou bem menos seletiva). Essa é minha base. Depois é só juntar um cereal (arroz, trigo, cevada, milho, pão, macarrão…), selecionar um ou dois temperos que se harmonizem com o resto e pronto. A sopa está pronta. Gosto de sempre finalizar minhas sopas de feijão com coentro ou salsinha fresca e uma dose generosa de suco de limão. Seguindo esse esquema, é difícil fazer uma sopa ruim.


Essa é minha última receita de sopa de feijão e, devo avisar, uma das melhores de todos os tempos. Uma das mais simples, também. Sem tomate, sem caldo de legumes. É raro aparecer uma sopa aqui em casa sem esses dois ingredientes. Mas descobri que o caldo do feijão, a água em que ele foi cozinhado, é muito melhor pra preparar sopas (de feijão). Descobri também que aquela história que não se deve salgar o feijão até ele estar totalmente cozido, senão ele demora mais pra ficar pronto, não passa de uma lenda. Sal não aumenta o tempo de cozimento do feijão coisíssima nenhuma! Eu testei várias vezes. A única coisa que aumenta o tempo de cozimento de leguminosas é acidez (nada de colocar tomate, por exemplo, num feijão que está cozinhando). O sal, ao contrário, deixa a pele do feijão intacta e o interior extremamente macio, cremoso, até. Faça o teste se não acreditar em mim. Perdão, minha mãe, mas nunca mais farei feijão como a senhora me ensinou.

Queria evitar o papo nutricional porque acho chato tentar convencer alguém a comer algo somente porque é carregado de nutrientes. Ainda mais essa sopa, que de tão deliciosa vai fazer você esquecer que ela é saudável. Mas preciso dizer uma coisinha. Com feijão, couve e brócolis, essa sopa é rica ferro, cálcio e tem muita proteína (e completa, já que o feijão vem acompanhado de milho). Também suspeito que ela tenha poderes mágicos. Nas noites frias do inverno palestino, quando sento sozinha pra degustar minha sopa de feijão, a solidão parece diminuir.

Sopa de feijão vermelho, milho e couve

Cozinho 1/2kg de feijão de manhã, com sal e umas folhinhas de louro, congelo uma parte dos grãos e guardo o resto pra preparar essa sopa à noite. É importante usar feijão cozinhado no mesmo dia, pois o caldo entra na composição da sopa. Uso feijão vermelho (deve ter um nome, mas não sei qual), que é extremamente saboroso, mas na falta, feijão preto também fica bom aqui. Milho fresco é infinitamente melhor do que enlatado, mas acho que não tem milho nessa época do ano no Brasil, então vou liberar o uso das latinhas dessa vez. Mas não deixe de experimentar com milho fresco quando as espigas começarem a aparecer na feira.

3x de feijão vermelho cozido (na água com sal e umas folhinhas de louro)
1 cebola grande picada
4 dentes de alho amassados/picados
2x de brócolis picado (buquês e talos)
1x de milho cru (o equivalente a uma espiga de milho), ou congelado, ou enlatado
2 folhas grandes de couve
1,2 litro de caldo de feijão (água onde o feijão cozinhou)
1cc de cominho em pó
1cc de semente de coentro em pó
1cc de páprica (melhor se for defumada), opcional
1cc de sal de salsão (se não tiver, use sal normal)
1 folha de louro
1cs de azeite, ou outro óleo vegetal
Um punhado de coentro fresco picado
Sal e pimenta do reino a gosto
Suco de limão pra servir

Em uma panela grande, aqueça o azeite e refogue a cebola picada durante alguns minutos. Junte o alho, o comino, semente de coentro, páprica e sal de salsão e refogue mais um minuto. Junte o milho e refogue mais dois minutos. Acrescente o brócolis, o feijão cozido, o louro e o caldo de feijão. Quando começar a ferver baixe o fogo e deixe cozinhar tampado em fogo baixinho. Se o caldo evaporar demais antes dos legumes ficarem pronto, junte um pouco de água. Retire o talo das folhas de couve, enrole bem apertado (formando um charuto) e corte em tiras finas. Quando os legumes estiverem cozidos junte a couve picada e o coentro, tampe a panela e desligue o fogo. A couve vai cozinhar no calor da sopa. Espere alguns minutos, prove a sopa, corrija o sal e acrescente pimenta do reino a gosto. Na hora de servir regue a sopa com suco de limão. Rende 4 porções.

19 comentários em “O mês da sopa

  1. Olá ! ! tudo bem?
    Eu também sou amarradona em uma sopa . Você consegue definir exatamente o que é fazer e degustar uma deliciosa sopa. Farei, com certeza, mas…..amiga……vou esperar o inverno pq. aqui no Brasil , onde moro com minha familia em Campinas-SP, está um calor insuportável.
    Aproveito a oportunidade para lhe dizer que estou aguardando receber minha aposentadoria para lhe dar minha pequena contribuição em seu novo projeto.
    Mais uma vez, obrigada por compartilhar.
    Ah! ! hoje fiz, novamente, o insopado de repolho. Uma D E L I C I A.
    Um abração.

  2. Olá,
    Adorei sua versão da sopa de feijão, adoro essa iguaria e com suco de limão, hummm!! Realmente, perfeito para o inverno, estamos passando um por um verão muito verão aqui no Brasil…
    Faço com nosso feijão carioquinha mesmo ou feijão preto, rasgo folhas de couve, oregano, cebola, alho e o limão pra finalizar. Acompanha um pão francês integral ou aveia, depende do dia e da vontade.
    Estou sempre de olho nas suas receitas, obrigada por compartilhar.
    Beijos, um dia colorido pra você.
    Lenita Vidal

  3. Que receita linda! Fácil, com ingredientes simples e, não tenho dúvidas, muito saborosa. Difícil é encontrar uma temperatura agradável para apreciar essa sopa aqui em Natal, que está cada dia mais quente.

    Obrigado pelo tempo que você reserva para nos presentear com essas maravilhas, Sandra! Abraço 🙂

    1. Rosa, Lenita e Pedro
      Concordo que no verão escaldante brasileiro, sopa de feijão não é muito atraente. Esse é um dos problemas de escrever um site pro público brasileiro, morando do outro lado do mundo: nunca estamos na mesma estação!

  4. Eu gosto de sopa, e adoro um caldinho de feijão bem temperado! Mas não é algo que gostaria todo dia! Prefiro variar!
    Uma pergunta nutricional… Parece que pra melhor absorção do ferro, não é bom ingerir, na mesma refeição, alimento com cálcio… Seria o caso mesmo? Ou talvez devêssemos ter essa preocupação só se estamos anêmicos?

    1. Aline, essa dúvida pairou na minha cabeça durante muito tempo. Eu não entendia como isso era possível já que a maioria dos vegetais ricos em ferro também são ricos em cálcio (folhas, gergelim, melado…). Mas enquanto fazia pesquisas sobre nutrição pra escrever o Guia do Herbívoro Feliz achei a resposta. Aqui vão os fatos:

      1- Cálcio realmente interfere com a assimilação do ferro, tanto do ferro vegetal (não-heme) quanto do ferro animal (heme), mas…
      2-somente doses elevadas de cálcio junto ao ferro atrapalha o trabalho do organismo.

      Tudo passou, enfim, a fazer sentido! Trocando em miúdos, somente alimentos muito ricos em cálcio, como laticínios, diminuem a quantidade de ferro assimilada pelo organismo e pouco importa se o ferro é de origem vegetal ou animal. Comer feijão com couve e brócolis? Sem problema! Almoçar feijão e comer iogurte de sobremesa? Péssima ideia! Misturar carne e queijo na mesma refeição? Outra péssima ideia. E por aí vai… Desconfio que por isso é mais comum ver vegetariano com anemia do que vegano. Se você consome laticínios é bom prestar atenção nisso.

  5. [Felipe é um nome fictício, não quero me revelar.]
    Olá… Isso não é um comentário de dúvida nem resposta, é só um desabafo. Pode ler se quiser. É porque não tenho com quem desabafar mesmo…..
    Tenho crises de vegetariano anualmente: ano passado fui veg por 6 meses. Em dezembro caí na tentação da minha família e no falatório em meus ouvidos (da família toda, ninguém me apoiava). Esse ano decidi voltar a ser vegano, mas com a situação daqui estou vendo que vai demorar… Eu NÃO me sinto bem comendo carne e seus derivados, não me sinto nada bem. Mas não trabalho então não tenho dinheiro, e não sei cozinhar e não tenho apoio de absolutamente ninguém.
    Tenho problemas no corpo inteiro, tomo 3 remédios por dia (pra espinhas, pra depressão e pra dor de cabeça), tenho asma, bronquite, alergias, e fico gripado/resfriado frequentemente.
    Tenho poucos amigos, mas estou me excluindo aos poucos por gostos diferentes e discussões bobas que se juntam e formam uma bola de neve.
    Esse ano irei pro Paraná, passei na faculdade federal de Curitiba. Mas meu curso não é o que eu quero. Eu nasci pra arte, pra escrita, pra música. Meu curso é de Exatas, algo nada a ver com o que eu gosto realmente de fazer. É só algo em que eu sou “bom” e sempre fui na escola. Fora que só escolhi isso por causa dos meus pais. Eles me expulsariam de casa pra sempre e nunca mais me dariam um sustento se eu fizesse algo relacionado a ARTES. Fora que eu sou homossexual e eles não sabem (e não podem, são reacionários de carteirinha).
    Estou entrando em uma crise GERAL na minha vida, não sei o que fazer, parece que a única saída é ir para o céu… estou com medo e não tenho pra onde ir.

    1. Não sei o que te responder. Gostaria de te mandar um email, mas estou com problemas na net daqui desde ontem e não consigo abrir minha caixa de emails. Espero resolver esse problema de internet amanhã, então poderei te escrever. Daqui até lá só posso te desejar muita coragem.

  6. Felipe: tente aguentar um pouco mais. Se você se esforçar, logo terá sua independência financeira e poderá sair dessa situação. Sendo bem prática: aproveite a boa fase dos concursos públicos, por exemplo, e se inscreva em um. Estude até cair de sono, com certeza você vai passar. Aproveite o pique do seu vestibular recente e estude algumas matérias a mais. E aguente firme! É só mais um pouco e isso se resolve. Você consome muitos alimentos industrializados? Pare com eles e, principalmente, com o açúcar. Ele faz um estrago no seu cérebro e te deixa triste. Coma muita uva e muito pêssego! Elas vão te devolver, nem que seja um pouco, a sua vontade de viver 🙂

    Sandra: eu reparei que cozinhando o feijão junto com o sal, a gente acaba usando muito menos sal do que qdo coloca depois. Eu AMO feijão. Se me prendessem numa ilha deserta eu levaria apenas feijão, banana e batata pra comer o resto da vida 😀

  7. Oi Sandra, como vai você?

    Já leio o seu blog há mais de um mês e estou gostando muito de tudo o que você escreve.

    Na verdade o encontrei porque procurava o modo de preparo da chia e aprendi com você como se faz.

    Tenho espiado todas as receitas e quase morri de inveja (rindo aqui) quando você disse que compra amêndoas de um senhor que tem um pé (de amêndoas) no quintal.

    Ontem estava chovendo e meio friozinho aqui em Sorocaba/SP e eu fiz a sopra de feijão vermelho. TUDIBÃO!!!!! Que cheiro e gosto maravilhosos.

    Meu marido adorou e disse que o cheiro do tempero lembrou o cheiro da comida da vó dele. Fiquei mais faceira que gansa nova de tão contente…rsrsrsrrs

    Sandra, todos os dias passo espiar seu blog!

    Te desejo zilhões de coisas boas!

    Marli Fiorotto – Sorocaba – SP

    1. Que lindo! Fazer ‘comida de avó” é o melhor elogio de todos. Acho que por isso adoro tanto cozinhar, pra levar reconforto, trazer boas memórias, cuidar… Obrigada por passar sempre por aqui. Um grande abraço.

  8. Felipe menino! Ergue essa cabeça e segue em frente! Não se desespere…paciência é a alma de tudo.

    Respire fundo e vai se fortalecendo aos poucos, vai ganhando independência.

    Que Deus ilumine todos os seus caminhos.

    Abraços.

  9. Oi Sandra!
    Esse foi meu jantar de hoje, não sobrou uma gota da sopa na panela.
    Esta sopa é simplesmente sensacional, uma mistura de brasil com méxico: adorei!
    bjs
    Susana

  10. Sandra! Gosto muito de sopa de feijão com canjiquinha e couve – e tomate, e mais o legume que tiver dando sopa. 😛

    Pelo que entendi das leituras aqui, essa combinação forma uma proteína vegetal completa, estou certa??

    Amo sopa de feijão com macarrão espaguete também. E uma boa pimentinha pra temperar, hehe!

    Beijos!

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