No final de janeiro fui convidada pela Teia dos Povos pra participar da Formação de Construtores e Defensores do Território, como formadora. Foi uma honra e uma alegria imensas aceitar fazer parte de algo tão inspirador e importante e hoje vim compartilhar um pouquinho do que vivi na semana em que estive no Assentamento Terra Vista, no sul da Bahia, onde aconteceu a formação.
Dei uma aula sobre a Palestina (pra explicar o contexto colonial – a colonização israelense da Palestina e a luta do povo palestino pela vida, por liberdade e por autodeterminação- e o que isso tem a ver com nós, aqui no Brasil), outra sobre “Descolonizar as práticas alimentares” e contribuí com o curso “Gastronomia do bioma – Mata Atlântica/Cabruca”. Também pude assistir a algumas formações políticas enquanto estive lá e depois de tantas conversas que alimentaram minha esperança e enriqueceram minha luta, voltei pra casa com a certeza que aprendi tanto, ou mais, do que ensinei.
As fotos acima foram da aula sobre a Palestina, que acompanhei de uma exposição com 45 fotos do fotógrafo palestino de Gaza Mohammad Zanoun. Conheci ele através de Anne, pois ambas fazem parte do mesmo coletivo (Activestills). Não foi fácil falar da Palestina enquanto Israel comete um genocídio contra a população de Gaza mas é muito importante fazer esse trabalho. As fotos são tão fortes que deixei muitas viradas pra parede. Só desvirei depois de dar a oportunidade pras pessoas que não estavam se sentindo bem emocionalmente de deixarem a sala de aula antes. Mas pra não falar somente dos horrores da ocupação israelense na Palestina e seu projeto de limpeza étnica, li vários poemas de resistência escritos por poetas palestinas e palestinos. Eu nunca tinha lido poesia (li até slam!) publicamente e emprestar minha voz à resistência palestina foi uma experiencia que me marcou muito. E quem estava naquela aula também saiu impactada.
(As fotos acima foram feitas por Alass Derivas e você pode acompanhar o trabalho dele aqui.)
Visitei o Assentamento Terra Vista (ATV) pela primeira vez há uns 6 anos e ele continuava tão lindo quando nas minhas lembranças. Contar a história desse lugar merece um post inteiro, então hoje vou só recomendar o documentário feito pelo Brasil de Fato (trailer aqui), que estou ansiosa pra ver, além de recomendar seguir o ATV aqui. Mas você também pode ler sobre a história do ATV na página da Teia dos Povos. Falar sobre a Teia dos Povos, essa aliança Preta, Indígena e popular, também exige tempo e carinho, então vou recomendar que vocês sigam a Teia dos Povos naquela rede social que me expulsou.
Não fiz fotos da aula sobre “Descolonizar as práticas alimentares”. Mas lembrei de fazer algumas fotos da aula prática dentro do curso de “Gastronomia do bioma”. Fomos guiadas por seu Loro, um agricultor assentado, durante uma manhã inteira dentro da mata. O objetivo era identificar os matos de comer (PANCs) e os de curar e seu Loro nos mostrou a riqueza da natureza naquele canto do mundo. Ele também abriu cacau e cupuaçu pra gente chupar e até mostrou como tirar o palmito da juçara.
Nunca tinha dado uma aula dentro da mata e, sinceramente, agora estou ainda mais convencida de que esse é um lugar incrível pra aprender.
Não vai dar pra contar tudo que aconteceu naquela semana num post. Vou precisar de mais algum tempo pra terminar de absolver tanto conhecimento e depois traduzir com minhas palavras, acrescentado de minha vivência e sentimentos. Mas não posso deixar de falar das pessoas que conhecei durante a formação. Não tenho foto de todo mundo, porque estava quase sempre imersa em conversas tão ricas que tirar o celular da bolsa e fazer fotos quase nunca cruzava a minha mente. Queria ter voltado com o retrato de todas as pessoas que conheci e que deixaram uma marca no meu pensamento e coração mas só tenho algumas poucas.
Um cheiro grande pra Airam, que me levou pra tomar banho de rio, Tulase, que preparou falafel e me deu conselhos preciosos, Suélen, que foi uma ajuda valiosa pra montar a exposição fotográfica e fazer os vídeos pra Teia (duas vezes!), seu Loro, nosso guia e professor, e Daniel, que me acolheu na noite que cheguei, me deu uma aula sobre a luta da população de rua em Belo Horizonte, da qual ele faz parte, e trouxe ideias pra enriquecer os vídeos que fizemos. Tem muito mais gente do assentamento, da Teia ou de passagem que conheci naquela semana e que estão no meu coração mas, como expliquei, voltei sem fotos desse povo lindo.
Felizmente lembrei de pedir uma foto com Kiune (obrigada por ser nossa fotógrafa, Airam!), minha grande amiga e companheira de luta há vários anos. Ela é de João Pessoa mas mora no assentamento e faz parte da Teia dos Povos. Kiune é uma das militantes antiespecistas mais inspiradoras que conheço. (Se quiserem conhece-la melhor, vejam as aventuras dela aqui).
Espero que não se passem outros 6 anos pra eu voltar ao ATV, nem pra rever seu Loro, Joelson, Solange, Deysi e todas as pessoas maravilhosas que povoam aquela terra encantada.
Gostaria de terminar esse post agradecendo as pessoas que apoiam o meu trabalho e que possibilitam não só a existência desse blog mas também minha participação em tarefas da militância, como essa formação. (Quem quiser apoiar também, é por aqui.)
*Foto da esquerda: eu organizando a aula prática de reconhecimento de matos de comer com seu Loro, na frente da casa dela, junto da vizinhança. A participação do gatinho na conversa foi decisiva. Foto da direita: a casa, no assentamento, onde fiquei hospedada.
Caramba, eu não participei, mas fiquei feliz lendo isso. Achei muito potente e instigante, temos que acreditar que a mudança virá, seja no espaço urbano ou no campo. Temos que construir uma resposta a essa barbárie capitalista.