A série de posts sobre comidas amazônidas (parte 1, no Acre e parte 2, em Manaus) está seguindo o caminho que realmente fizemos no final do ano passado, por isso agora preciso falar sobre a viagem de barco de 5 dias que fizemos no Amazonas, entre Manaus e Belém.
Desde que começamos a sonhar com esse projeto, apareceu a vontade de fazer uma viagem de barco. Pensamos: “Quando teremos outra oportunidade de navegar pelo rio Amazonas?” Eu estava viajando pra conhecer as histórias das pessoas e dos bichos, mas também das árvores e dos rios.
A viagem é bem menos bucólica do que uma pessoa não-amazônida pode imaginar. E não tive a experiência do redário, que é mais típico. Alugamos uma cabine porque estávamos viajando com material de fotografia e muita bagagem, mas também porque, no meio de quase dois meses de trabalho, precisávamos descansar um pouco antes da etapa seguinte. É muito caro viajar assim e a cabine deixou muito, muito a desejar. Não estava esperando luxo, nem sequer um grande conforto. Mas um mínimo de limpeza, eu esperava. Foi uma daquelas experiências que você fica super feliz de ter feito, mas que não faria novamente por nada.

A outra razão pra reservar uma cabine no barco foi poder ter acesso a um frigobar. Eram 5 dias de viagem e, apesar de ter refeições à bordo, só o almoço podia ser adaptado pra ficar 100% vegetal. O jantar sempre era sopa com animais e o café da manhã era sempre pão com queijo e presunto. Ou seja, tivemos que levar quase toda a nossa comida e improvisar refeições sem ter fogão à disposição.
“Ah, deixei de ser vegana porque viajo muito!” Gente, se fosse verdade que é impossível ser vegana e viajar, eu já teria deixado de ser há tempos. Já me tornei um disco arranhado de tanto repetir isso, mas lá vai: se planejar direito, dá certo. Lembre-se que viagem é, por definição, uma situação fora da sua rotina e de caráter temporário. O que estou querendo dizer com isso? Que não vai ser perfeito, que em casa você comeria melhor, que alguns dias você não vai se alimentar de maneira tão nutritiva, mas que tudo bem porque ninguém vai morrer de carência nutricional se passar uns dias se alimentando mal.
Minha estratégia no barco foi focar em preparar um café da manhã bem nutritivo, com algo que a gente acha gostoso e que nos alimenta por horas, almoçar no barco e levar alguns ingredientes prontos pra serem degustados no lanche e no jantar. O jantar era bem leve, mas comíamos melhor no resto do dia.
O café da manhã de todo dia era aveia dormida com chia e leite de castanha (de caixa), banana, pasta de amendoim em pó (comprei especialmente pra essa viagem), castanha-da-Amazônia, nibs de cacau e granola de cacau (comprada pronta).
Como antes do barco estávamos num apartamento em Manaus, pude preparar um mix pro café da manhã. Num potinho misturei a aveia com a chia, numa quantidade que desse pra viagem inteira. À noite eu misturava com leite de castanha e colocava no frigobar da nossa cabine. Na manhã seguinte eu acrescentava os outros ingredientes. A foto à direita foi de um dia em que tomamos um segundo café da manhã, com pão, queijo de castanha meia-cura (do Salgados Veganos Manaus) e café do barco. Aliás, ser vegana num barco na Amazônia é fichinha! Nosso maior desafio foi o café.
Anne e eu tomamos café sem açúcar e quando a gente viaja pelo interior do Brasil, principalmente em lugares pouco- ou nada- turísticos, encontrar café não-adoçado é um desafio. Eu acho café adoçado algo intragável, então por mais viciada que eu seja, prefiro ficar sem café. E olha que isso me rende uma bela dor de cabeça (o vício é uma coisa horrorosa). Felizmente, no segundo dia conversei com a cozinheira e ela aceitou fazer um pouco de café sem açúcar só pra gente, com a condição de chegar no começo do serviço. Glória!
As fotos acima foram feitas na nossa cabine. Repare que minha “bancada de cozinha” era o frigobar e tive que me virar pra preparar as coisas ali. Me programei pra passar no restaurante vegano maravilho do qual falei no post anterior um dia antes de embarcar. Então comprei um molho à bolonhesa de tofu, congelado (o macarrão, eu cozinhei no apartamento onde estava e coloquei na marmita pra ser o primeiro almoço da viagem, já que no primeiro dia, a cozinha do barco não funciona ), mais o queijo de castanha meia-cura, tofu defumado em fatias (maravilhoso!)e pão de macaxeira. Também comprei umas bolachas salgadas de linhaça (crackers), chocolate e algumas frutas. E levei também um tucumã preparado por mim (sobras do meu X-Caboquinho).
As fotos abaixo foram dos nossos jantares: macarrão com bolonhesa de tofu, abacate com cebolinha e limão, tucumã refogado e triturado e pão de macaxeira e uma mistura dos dois. Sim, era um pouco repetitivo, mas foram só 5 dias. E, sinceramente, não dá pra reclamar dessa comida maravilhosa.

Abaixo, além do abacate, tucumã e pão de macaxeira, tem o tofu defumado e fatiado que falei. E mangas!
Comprei bastante banana e manga e foram as frutas que comemos durante toda a viagem (além do abacate, claro). Queria ter feito alguma foto dos lanches (crackers de linhaça com queijo de castanha, chocolate ou manga), mas esqueci.

Abaixo uma foto do almoço servido no barco. Se pedir sem carne (sem animal), ficava 100% vegetal: feijão, arroz, macarrão e farofa (com óleo e alho). O acréscimo da banana ficava por minha conta, porque adoro feijão com banana. Comi isso 4 dias seguidos (o primeiro almoço, como eu disse, levei pronto) e no final da viagem a gente estava sonhando com uma salada crua colorida, com um suco fresco e com um tempero melhor, mas, vou repetir, é uma situação provisória, logo totalmente suportável. Eu não vou reclamar de ter feijão e arroz no prato, né?

Antes que alguém diga, eu sei que fiquei numa cabine, com acesso a um frigobar, e que isso facilitou a minha vida. Daria pra ter tido uma alimentação 100% vegetal se a gente tivesse comprado uma passagem no redário? Daria. Seria menos saboroso, mas ainda assim daria pra não morrer de fome nem passar mal com alguma carência (ninguém desenvolve uma carência em apenas 5 dias). Eu teria misturado a aveia com água (afinal, foi exatamente pensando nisso que comprei a pasta de amendoim em pó, que se transforma num leite cremoso com o acréscimo de água). Teria almoçado no barco do mesmo jeito, os lanches seriam os mesmos e teria jantado pão com frutas.

Esse post era pra falar sobre o que comemos no barco e sobre como dá pra ser organizar e fazer uma viagem desse tipo sendo vegana, então não vou falar do que vi e vivi pra além da comida hoje. Um dia, talvez, eu fale dessa experiência. Ou talvez mantenha ela guardada no peito.
Viajei com você nos últimos posts, Sandra! É sempre muito bom ler você 🙂