Em 1977 o cineasta Polanski confessou, num tribunal dos EUA, ter estuprado uma menina de 13 anos. Condenado, ele fugiu do país antes de ser preso e nunca mais voltou. Desde então outras 11 mulheres o acusaram de estupro. Semana passada aconteceu a cerimônia dos Césars, a maior premiação do cinema francês. Polanski estava concorrendo a 12 prêmios, incluindo melhor diretor e melhor filme. 12 mulheres estupradas e 12 nomeações pro homem que as estuprou. “É preciso separar o homem do artista”, vomitavam os perpetradores da cultura do estupro. “Se seu padeiro estuprasse 12 mulheres, incluindo crianças, você separaria o homem do padeiro?”, “Quando uma mulher é estuprada não importa a profissão do estuprador nem se ele a pratica com talento” respondiam as mulheres. Os guardiães do patriarcado tinham sido particularmente cruéis dessa vez. Concorrendo ao prêmio de melhor atriz, pelo filme “Retrato da jovem em chamas” (que concorria ao prêmio de melhor filme, junto com o filme de Polanski), estava Adèle Haenel, que no final do ano passado levou ao público o fato de ter sido agredida sexualmente por um cineasta dos 13 aos 15 anos. Ela, que declarou: “Premiar Polanski é cuspir na cara das vítimas”, foi à cerimônia dos Césars junto com a equipe do filme “Retrato…”, feito por uma cineasta, com uma equipe quase exclusiva de mulheres, contando a história de duas mulheres que se amam. Esse filme me fez soluçar no cinema e todas nós torcíamos pra que ele e sua diretora levassem o prêmio. Mas o cinema francês, cúmplice, fiel aos seus amigos homens, mesmo os que cometem crimes de pedofilia, não deu o prêmio a “Retrato…”, nem à sua atriz principal. Era preciso punir Adèle por ter ousado sair do silêncio. Por ter levantado a voz e criticado esse clube do Bolinha sexista que é a indústria do cinema. Mas a punição não foi suficiente: era preciso “cuspir na cara das vítimas”. E assim Polanski ganhou o prêmio de melhor diretor. Nesse momento Adèle e a equipe de “Retrato…” se levantaram e saíram da sala. Embaixo do vestido de gala, a indignação. “Que vergonha! Palmas pra pedofilia!” ela repetia enquanto juntava o gesto à palavra.
Continuar lendo “E lutaremos em seu nome”Autor: papacapim
Chucrute
Faz 8 anos que publiquei aqui a receita do chucrute que faço regularmente em casa. De tanto fermentar legumes acabei simplificando a técnica, então vim aqui vou postar as instruções atualizadas.
Continuar lendo “Chucrute”Leite de amendoim em segundos
Que tempos difíceis estamos atravessando, não é? Mas além de não me sentir pronta pra falar sobre a pandemia que nos colocou em quarentena na maior parte do mundo, estimo que já tem gente demais falando sobre isso no momento. Então me permita te distrair por alguns minutos com leite de amendoim.
Continuar lendo “Leite de amendoim em segundos”Quem dita as regras do veganismo?
Uns meses atrás publiquei uma série de stories no meu Instagram (os jovens não leem mais blogs, infelizmente) sobre a tendência dentro do movimento vegano de eleger algumas vozes como mais legítimas pra “definir o que é vegano” do que outras e considerar a posição de grandes ONGs internacionais como “oficial”, classificando as visões diferentes como “opinião pessoal”.
É um debate que precisa ser feito, então vim trazer a conversa pra esse espaço também.
Fermente seu grãomelete
O texto poderia ter só essa frase, mas vou desenvolver a ideia, caso você precise ser convencida.
Lembram do meu grãomelete, o omelete à base de grão de bico? Lembram que fiz uma versão atualizada com farinha de grão de bico? Pois vim atualizar essa receita novamente e tenho ótimas razões pra isso.

Por um veganismo que promove autonomia alimentar
Ano passado a chef Paola Carosella causou um grande alvoroço dentro da comunidade vegana por causa da reação dela (via Twitter) depois de ter provado um hambúrguer vegetal que imita a textura e o sabor de carne animal. Acho oportuno abrir espaço pra discutir as declarações dela, pois acredito que podemos extrair algumas lições importantes do ocorrido.
Continuar lendo “Por um veganismo que promove autonomia alimentar”Grão na chapa
Gosto de pensar que sou uma pessoa modesta. Recebo elogios de bom grado, mas não saio por aí “contando vantagem”, como a gente diz na minha terra (se você precisa de tradução, essa expressão significa “fazendo elogios, não merecidos, a si mesma”). Mas de vez em quando eu desenvolvo uma receita que me faz inchar de orgulho. Mais ainda quando não se trata de uma receita propriamente dita, o que envolve vários ingredientes, muitos testes e muita louça pra lavar antes de chegar na versão final, a que compartilho aqui no blog. Isso é um trabalho que necessita criatividade, obviamente, mas é o resultado de 90% de transpiração e 10% de inspiração, como dizem que disse Einstein. Agora, quando a “receita” em questão é uma ideia que brotou na minha cabeça, puf!, que necessita apenas 2 ingredientes e que deu certo de primeira, aí eu não consigo conter o entusiasmo (se você estivesse do meu lado nesse momento me veria dando um discreto beijinho no ombro).
Continuar lendo “Grão na chapa”Farofa rica
Em setembro confessei aqui no blog a minha recente história de amor com a farofa e compartilhei a receita da minha farofa mais popular.
Mas isso não é exatamente verdade. Sim, minha farofa de banana e couve é extremamente popular na minha família, mas um dia fiz uma versão ligeiramente modificada dessa receita e o sucesso foi ainda maior. Chamei essa obra-prima comestível de “farofa rica”.
Continuar lendo “Farofa rica”Novas datas de tour em Paris
Lembram dos tours político-veganos em Paris? Em 2020 eles voltarão com força total. Até criei uma página aqui no blog pra explicar melhor a proposta. Convido as pessoas interessadas a darem uma olhada lá pra entender melhor a proposta desse projeto.
Continuar lendo “Novas datas de tour em Paris”Como comecei a cozinhar
Escrevi meu primeiro caderno de receitas com onze anos, mas comecei a cozinhar bem antes disso. Minha mãe, que nunca gostou de cozinhar, nos encorajou a fazer nossa própria comida desde muito cedo. As receitas do caderno eram de apenas um tipo: recheios pra colocar dentro do pão ou tapioca, todos variações de ovo mexido. Lembro que a única receita que não envolvia ovo era ‘pão frito’: pão em cubinhos, frito em muita, muita margarina. Embora não tivesse entrado no caderno, meu repertório da época também incluía bolachas cozinhadas no leite, papa de aveia com canela, vitamina de banana com achocolatado e, em um momento onde eu me senti particularmente gourmet, patê de salsicha e cebola crua, criado em colaboração com uma prima.
Continuar lendo “Como comecei a cozinhar”Caros camaradas,
Temos, geralmente, tendência a exagerar nossa força e nossa fraqueza: assim, durante tempos revolucionários, parece-nos que a menor de nossas ações deve ter conseqüências incalculáveis e, por outro lado, em certos momentos de marasmo, toda a nossa vida, embora inteiramente dedicada ao trabalho, parece-nos infrutífera e inútil, e acreditamos que somos levados pelo vento da reação.
Continuar lendo “Caros camaradas,”O conto do ovo que não mata a galinha
Frequentemente perguntam à pessoas veganas o que achamos de ovos de galinhas criadas no quintal. Até prometi à uma leitora escrever sobre isso aqui no blog e, anos depois, ainda estou devendo esse post. A conversa de hoje não é exatamente sobre isso, mas se aproxima. Semanas atrás vi esse letreiro (foto acima) numa estação de metrô em Paris. Ele me deu a ideia de vir aqui trazer alguns esclarecimentos quanto à ligação entre consumo de ovos, exploração e crueldade animal, mas também tocar em um ponto que está causando divergências dentro do movimento vegano.
Continuar lendo “O conto do ovo que não mata a galinha”Tostada de chuchu
Ainda não é oficialmente inverno no hemisfério norte (o solstício de inverno é no dia 22 de dezembro esse ano), mas as noites já estão mais longas que os dias, o frio já se instalou e a luz natural já está fazendo falta. E isso tem um efeito interessante no meu apetite. Por um lado desejo comidas quentes e pesadas (sopa, muita sopa! creme!!!), pra aquecer o estômago e me proteger do inverno. Mas ao mesmo tempo sinto falta das frutas e verduras que crescem no calor, principalmente as da minha região no Brasil. É um fenômeno curioso, esse. Ao mesmo tempo que meu corpo demanda sopa e cogumelos, minha cabeça não para de pensar em abacaxi, quiabo e mamão.

Islamofobia e por que se opor a esse tipo de racismo é uma pauta feminista
Duas coisas estão me revoltando profundamente aqui na França: o tratamento dado a migrantes/refugiados e a islamofobia. Pretendo falar sobre a questão de pessoas migrantes outro dia, porque essa militância está ocupando boa parte do meu tempo aqui. Mas hoje queria chamar vocês pra uma conversa sobre islamofobia. Pode parecer algo distante de nós, ou talvez você tenha uma visão negativa de pessoas muçulmanas, mas continue lendo que você vai entender por que essa questão não só é importante pra nós, como é também uma questão feminista.
Continuar lendo “Islamofobia e por que se opor a esse tipo de racismo é uma pauta feminista”O Sertão e o Litoral no prato
Tem um prato que fez parte da minha infância no RN e que ainda me transporta algumas décadas no passado sempre que o preparo. É algo de uma simplicidade enorme e que eu achava que todo mundo, pelo menos todo mundo no meu mundo, o Nordeste, conhecia. Mas descobri esse ano que até mesmo dentro do meu estado a receita era desconhecida de muitas pessoas. Então me incumbi da missão de compartilhar essa humilde receita com o maior número de comedores possível, pois sinto que ela está ameaçada de cair no esquecimento geral.
Continuar lendo “O Sertão e o Litoral no prato”Se você tem a sorte de ter um forno
Durante a procura por apartamento aqui em Paris, um dos meus critérios de busca era ter fogão a gás. Em uma cidade onde quase todas as cozinhas são equipadas com placas elétricas, um fogão a gás é algo extremamente raro. Meu lar atual tem placas elétricas modernas (funciona por indução, seja lá o que isso quer dizer), mas apesar de preferir cozinhar com fogo, acabei me resignando. Sinto que tem algo de estéril em uma cozinha fria, onde não tem chama. (Crudívoras, não me detestem!) Talvez eu ainda me sinta muito apegada ao ato primitivo de reunir a comunidade ao redor do fogo e preparar o jantar enquanto se conta histórias. Talvez seja porque sou cozinheira e sei que não ter acesso à uma chama limita a gama de preparações culinárias possíveis (não posso preparar meu amado muta’bal, por exemplo). Mas o que tenho por enquanto são duas bocas elétricas e já adaptei minhas refeições ao que está ao meu alcance no momento.
Continuar lendo “Se você tem a sorte de ter um forno”A vinaigrette de Céline
Menos de dois meses em Paris e a vontade de escapar dessa selva de pedra e respirar um ar mais puro já estava batendo no teto. Felizmente a poucas horas de trem daqui fica o vilarejo do meu sogro, no interior da França. A região é verde, cheia de bosques e vulcões adormecidos e a casa dele tem um jardim lindo de 1ha, além de dispor de uma lareira na sala. Eu brinco que a casa dele é um resort de luxo pra mim e ele responde que eu posso visitar o resort dele sempre que quiser.
Continuar lendo “A vinaigrette de Céline”“A solução não passa pelo capitalismo. Ela o derruba.”
Em pouco mais de um mês tivemos três grandes eventos veganos aqui em Paris. Se não me engano os três maiores do ano. Estive nos três, porque quero descobrir como o movimento vegano está se organizando aqui. Me tornei vegana quando ainda morava em Paris, em 2007, mas na época veganismo na França era algo praticamente desconhecido e não tinha eventos nem encontros veganos na capital.

Tour gastronômico em Paris
Lembram do tour gastronômico que organizei em Paris ano passado? Agora que voltei a morar aqui, esse projeto vai fazer parte das minhas atividades profissionais regulares. A ideia é fazer tours organizados duas vezes por ano (no inverno e na primavera), mas quem estiver de passagem pela cidade fora dessas datas terá a possibilidade de me contratar por um dia (ou mais) em um tour privê.
Continuar lendo “Tour gastronômico em Paris”Exercício de economia doméstica
Estava na rua resolvendo coisas e voltando pra casa decidi passar pelo mercado de produtos orgânicos que fica no caminho, já que a geladeira estava vazia. Acontece que eu só tinha 15 euros na bolsa, o que aqui não é grande coisa. Comprar comida pra semana, pra duas pessoas, com um orçamento tão limitado seria um exercício interessante de economia doméstica. A verdade é que não tenho trabalho remunerado no momento e preciso mesmo manter as despesas sob controle. Mas a Pollyanna que mora em mim viu aquilo como uma oportunidade pra ser mais criativa na cozinha.
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