Alguns dias atrás o curso de Árabe que vim fazer aqui em Beirute terminou. Foram só cinco semanas, mas o alívio que senti no último dia de aula foi grande. Eu já tinha esquecido o que significa acordar cedo pra ir pra escola e passar a maior parte do seu dia sentada, olhando pra lousa ou pros cadernos. Mas adorei ter feito esse curso, pois aprendi, enfim!, a escrever e a ler em Árabe e conheci pessoas maravilhosas que espero manter na minha vida. E foi uma grande lição de humildade ser alfabetizada novamente aos 34 anos e ter que ler, na frente do professor e de uma sala repleta de alunos, com a mesma dificuldade e na mesma velocidade de quando eu tinha 6 anos (“b…b…ba…r…c…bar…co. Barco!). Aprender uma língua estrangeira depois de adulta é difícil, mas aprender uma língua estrangeira que tem um alfabeto completamente diferente do seu e que ainda por cima se escreve na direção oposta é como contratar um personnal trainer pros seus neurônios. Eles vão sofrer, suar, se esbaforir e quase colocar os bofes pra fora, mas sairão da experiência mais fortes e em melhor forma. Eu e meus coleguinhas de curso estamos nos sentindo muito mais sabidos agora do que cinco semanas atrás. Nos encontramos na rua e nos olhamos com respeito mútuo, pois fazemos parte do grupo que conseguiu conjugar os prefixos e sufixos do sistema verbal árabe- gênero, número, tempo e grau de probabilidade- escritos com letras que se metamorfoseiam de acordo com a posição dentro da palavra e que ainda por cima se escreve da direita pra esquerda!
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A super papa
Muito obrigada pelas mensagens deixadas no meu último post. Ainda não tive tempo de reponder a cada um de vocês, mas queria que soubessem que elas me encheram de alegria. Estou nesse momento abraçando mentalmente cada um de vocês. Obrigada.
Continuo (extremamente) ocupada com o livro (pra todos os que pediram mais informações sobre ele, aguardem que em breve falarei mais sobre o assunto) e sem meu computador. Estou usando um computador emprestado, mas que está mais cansado do que eu, tem um teclado sem nenhum acento e que não corrige textos em Português, por isso vou logo me desculpando se cometi algum atentado à nossa língua. Mas esse blog está precisando muito de uma receita. E não qualquer receita, uma receita capaz de reconfortar depois desse período tão sombrio Continuar lendo “A super papa”
Biscoitos de aveia, tahina e passas
Depois de mais de quatro anos de veganismo eu não sinto falta de (quase) nenhum produto de origem animal. Mas de vez em quando me sinto tentada a quebrar meu veganismo não por sentir desejo de comer algo não vegano, mas por pura preguiça. Explico. Por mais que eu adore cozinhar, às vezes gostaria de comer algo que não tenha sido preparado por mim. Isso me pouparia o trabalho, a limpeza da cozinha, a lavagem de louça… Nesses momentos já me aconteceu de entrar em uma mercearia, ver um biscoito escocês ou um sorvete americano que eu adorava quando era onívora e sentir a tentação de comprá-los. Existem versões veganas desses itens por aqui, mas a qualidade é tão pobre, e a lista de produtos químicos tão longa, que nunca tenho vontade de comê-los. Geralmente saio correndo da mercearia pra não ter que escutar a briga do anjinho do ombro direito com o diabinho do ombro esquerdo. Felizmente assim que coloco os pés fora da mercearia me dou conta que o que me empurrava pra aquele biscoito não era a vontade de comê-lo (dificilmente algo industrializado, mesmo vegano, agrada o meu paladar), mas sim a preguiça de cozinhar.
Continuar lendo “Biscoitos de aveia, tahina e passas”Eu achei que deveria
Faz mais de dois meses que não publiquei nenhuma receita de sobremesa e se você é novo por aqui deve estar achando que doces não fazem parte da minha dieta. Leitor(a), você achou certo: as sobremesas tradicionais não me seduzem e eu não como açúcar (estou me referindo ao pó branco) nunca, nem amarrada, nem pra ganhar dinheiro. Mas não se engane, eu gosto de degustar uma coisinha doce aqui e acolá. No entanto, entre junho e setembro (o verão aqui) a feira fica carregada de uvas deliciosas, mangas suculentas, pêssegos e figos perfumados e tantas outras frutas saborosas que esqueço completamente dos bolos, pudins, sorvetes e afins. E vou confessar uma coisa. Quando eu mordo um pêssego maduro (que amadureceu no pé) e aquele sabor inebriante invade minha boca e narinas penso: “Nenhuma sobremesa é nem nunca será tão perfeita” e aí perco a vontade de criar receitas doces. Juro. Podem me chamar de xiita.
Continuar lendo “Eu achei que deveria”Um dia…
Alguns dias atrás vi a lista dos 50 melhores restaurantes do mundo desse ano e fiquei muito feliz em descobrir que o paulista D.O.M. ficou em sétimo lugar (eles eram o número 18 ano passado). Se você ficou curioso pra saber quem é o número 1, a resposta é Noma, em Copenhague (lista completa aqui). Eu admiro muito o trabalho do chef Alex Atala, criador do D.O.M. Ele foi buscar inspiração na Amazônia, incorporou produtos tipicamente brasileiros, como palmito pupunha, baru, jambu, tucupi e até priprioca, nos seus pratos e sua culinária 100% tupiniquim não só provou ao mundo, e aos brasileiros, que sim, temos uma identidade gastronômica própria e digna de interesse, mas também criou um movimento de valorização dos produtos da terra que foi seguido por vários outros chefs. Só não gosto mais de Atala porque alguns anos atrás li na revista Trip uma declaração dele que me deixou chocadíssima. Ao falar do impacto da nossa alimentação na crise climática, ele disse algo como “E vegetarianismo não é a solução, já que o cultivo da soja está destruindo a Amazônia”. Eu já ouvi esse disparate da boca de algumas pessoas que nunca colocaram o pé no Brasil, mas não esperava essa ignorância de alguém que conhece a Amazônia tão bem e trabalha diretamente com nativos da região. Mas torço pra que ele tenha descoberto que a soja da Amazônia serve pra alimentar o gado que vai virar bife pro onívoro, não pra fazer tofu pro vegetariano e não pude deixar de ficar feliz pelo D.O.M. fazer parte dos sete melhores restaurantes do mundo e ter recebido o prêmio de “Melhor Restaurante da América do Sul”.
Continuar lendo “Um dia…”Aveia dormida
Já percebeu que todas as receitas da sessão “café da manhã” do blog contêm aveia? Aveia é um dos meus alimentos preferidos e, por ter tanta fibra, vitaminas, minerais e ser rápido de preparar, acho que ela é perfeita pro café da manhã da semana. Nos fins de semana gosto de longos e fartos cafés da manhã, mas quando o tempo é curto prefiro a praticidade e a simplicidade de um prato de aveia. Em poucos minutos preparo uma refeição super nutritiva e que me dá energia até a hora do almoço, além de trazer reconforto nessas manhãs frias de inverno. Continuar lendo “Aveia dormida”
Faça como os suíços
Quando o assunto é cereal muita gente pensa que granola é a alternativa mais saudável que existe. Se você é uma dessas pessoas saiba que a invenção americana* tem um irmão suíço que nasceu quase ao mesmo tempo, no finalzinho do século 19, e que é muito melhor pra saúde. A granola mudou bastante até se transformar no cereal doce e crocante que conhecemos hoje, mas o muesli (ou müsli) continua bastante próximo da receita original criada por um médico suíço em 1900. Embora os ingredientes de base sejam os mesmos (aveia, oleaginosas e frutas secas), exite duas diferenças fundamentais entre esses cereais. Enquanto a granola tem sempre alguma forma de açúcar e óleo e é assada, o muesli não é adoçado, não contém óleo e todos os ingredientes são crus. Como ele não passa pelo forno, a textura é leve. As sementes e oleaginosas acrescentam uma nota crocante mas o resultado final é bem mais delicado do que a granola. Continuar lendo “Faça como os suíços”
O que servir no café da manhã
Quando vim morar com Anne tivemos dificuldades em achar um café da manhã que agradasse as duas. Eu comia papa de aveia, ela estava acostumada a tomar café preto, sem açúcar, e nada mais. Até me conhecer, Anne achava que aveia era comida pra cavalo. Antigamente na França os cavalos eram alimentados com aveia e até hoje os franceses, principalmente no interior, não têm o hábito de comer esse cereal. Continuar lendo “O que servir no café da manhã”
Mãe, aveia e reconforto
Tem uma comida que ocupa um lugar especial no meu coração: papa de aveia. Papa de aveia lembra minha mãe e significa reconforto dentro de um prato. Durante os frios e escuros invernos franceses, eu costumava voltar pra casa depois de um cansativo dia de estudo/trabalho e preparar uma grande cumbuca de papa de aveia. Aquele era o jantar mais perfeito do mundo e me dava forças pra continuar minha dura rotina no dia seguinte. Quando me mudei pra Palestina, dividi uma casa com outras três moças durante seis meses. A triste realidade daqui e nosso trabalho voluntário no campo de refugiados ao lado consumiam toda a nossa energia. A noite a gente sentava na sala, cada uma com um prato de papa de aveia na mão, e conversava durante horas sobre a ocupação militar, nossos problemas e a vida em geral. Nós refazíamos o mundo ao redor da papa de aveia. Outro dia estava conversando com uma das meninas, a única que, como eu, ainda mora aqui, e chegamos à conclusão que minha papa de aveia nos ajudou a superar muita coisa. Continuar lendo “Mãe, aveia e reconforto”