Sobremesa sem desculpas

Pavê de banana com coco, baunilha e rum

Acho que não é mais segredo que não sou muito fã de sobremesas. Eu gosto de um pedacinho de bolo de vez em quando e com certeza aprecio um cookie ou um gelato bem feitos, mas a verdade é que raramente sinto desejo de comer doces. E como aqui em casa só tem eu e Anne, isso significa que qualquer sobremesa que eu fizer será dividida por dois e eu terei que dar conta de metade de um bolo de chocolate! Parece um sonho pra você? Pra mim não. Então geralmente só faço sobremesas quando temos convidados pra jantar. O que aconteceu sábado passado.

Como o prato principal era lasanha (receita nova que espero publicar aqui no dia que descobrir como fazer uma lasanha branca parecer atraente na foto) eu queria uma sobremesa leve. Criei esse pavê de banana com coco, baunilha e rum pra um dos jantares no meu “restaurante ocasional” ano passado. Foi um sucesso absoluto entre meus convidados europeus. Pois é, europeus. Sempre fico com receio de dividir minhas receitas de sobremesas com o pessoal do Brasil. Eu conheço suficientemente bem o repertório de sobremesas do meu país pra saber que “leve”, “pouco doce” e “sobremesa” nunca são combinados na mesma frase. Claro que não reclamamos diante de uma salada de frutas, embora boa parte dos meus compatriotas despeje uma dose generosa de leite condensado no seu prato antes de comê-la. Mas a verdade é que as sobremesas que fazem o pessoal da minha terra salivar são extremamente doces e carregadas de gordura, vinda de latinhas de leite condensado e creme de leite.

Esse pavê está bem longe das sobremesas descritas acima. Ele é leve e delicadamente perfumado com baunilha e rum. Gosto de usar biscoitos do tipo “speculoos” (os da marca “Lotus” são os melhores e são veganos), uma especialidade belga ligeiramente caramelizada e com toques de canela. Nunca vi esses biscoitos no Brasil mas você pode substituí-los por seu biscoito preferido. O importante é que ele não seja muito doce e tenha um sabor que se harmonize com os outros ingredientes. O leite de coco deixa o creme mais cremoso, mas o sabor fica bem suave no final. Pra mim uma sobremesa merece nota 10 quando os sabores são deliciosos e claramente detectados, sem uma espessa camada de açúcar encobrindo tudo, e as texturas interessantes. Esse pavê é um ótimo exemplo disso. Banana, rum, baunilha e coco vão muito bem juntos e as camadas diferentes oferecem texturas que se complementam.

Será que essa sobremesa vai fazer sucesso na sua casa? Se você for vegano, com certeza. Se leite condensado é pra suas sobremesas o que oxigênio é pros seus pulmões, talvez não. Mas comer algo leve de vez em quando (especialmente quando o assunto é sobremesa, que sempre chega quando seu estômago já está cheio) não deixa de ser uma boa idéia. E quer saber? Decidi que essa foi a última vez que dei explicações e me desculpei por uma sobremesa que criei. Existem milhões de receitas carregadas de açúcar e gordura por aí e ninguém vai ficar decepcionado se eu continuar criando receitinhas mais leves. Principalemente quando elas são tão saborosas quanto esse pavê.

Pavê de banana com coco, baunilha e rum

Você pode substituir os speculoos por biscoito do tipo “maizena” ou “maria”. Se estiver usando um favo de baunilha corte-o ao meio no sentido do comprimento e, com a ponta da faca, raspe as sementes. Guarde o favo dentro de um pote de açúcar (o açúcar ficará deliciosamente perfumado) ou faça seu próprio extrato de baunilha, guardando os favos usados dentro de uma garrafinha com algum álcool forte, como whisky, e deixando macerar durantes várias semanas. Detesto sobremesas doces demais então uso o mínimo possível de xarope de bordo. Se você quiser um pavê mais doce aumente a quantidade de xarope/açúcar no creme. Gosto de fazer pavês individuais pois é mais bonito e mais fácil de controlar as porções.

2 bananas médias

8,10 biscoitos speculoos, quebrados em pedacinhos pequenos (essa quantidade pode variar dependendo do tamanho do biscoito usado)

1 ½ x de leite de soja

5cs de creme de coco (a parte cremosa do leite de coco)

2cc de amido de milho

2cs de xarope de bordo, ou açúcar demerara

1 favo de baunilha (as sementes), ou 1/2cs de extrato natural de baunilha

uma dose mais 1cc de rum envelhecido

1cs de óleo de coco (ou azeite) pra fritar as bananas

Comece colocando uma lata de leite de coco na geladeira por pelo menos duas horas. O leite de coco vai se separar: a parte cremosa (gordura) vai ficar em cima e a parte mais líquida (água) embaixo. Abra, tomando o cuidado de não sacudir a lata, e retire 5 cs do creme que se encontra na superfície. Guarde o resto pra outra utilização. Em uma panela pequena, misture o creme de coco com o leite de soja, o xarope de bordo (ou açúcar) e as sementes de baunilha (se estiver usando extrato, acrescente depois). À parte dissolva o amido de milho em 2cs desse líquido e despeje tudo na panela. Cozinhe em fogo baixo, mexendo sempre com uma colher de pau, até engrossar ligeiramente. O creme continua a engrossar enquanto esfria. Desligue o fogo e junte 1cc de rum e o extrato de baunilha, se não estiver usando as sementes. Cubra com papel filme* pra impedir que uma película (nata) se forme,ou faça como eu: continue mexendo o creme até ele esfriar completamente. Aqueça o óleo de coco (ou azeite) em uma frigideira, de preferencia de ferro. Descasque e corte as bananas ao meio, no sentido do comprimento. Frite até ficar dourado dos dois lados. Despeje uma dose de rum (eu não meço, mas deve ser umas 3cs) e imediatamente incline a frigideira sobre a chama, deixando o fogo “entrar” na frigideira, pra flambar as bananas. Monte os mini pavês: despeje metade do creme frio no fundo de 6 copinhos, cubra com uma camada de biscoitos quebrados, seguido das bananas flambadas em pedaços, mais uma camada de biscoitos quebrados e termine com o resto do creme. Cubra cada copinho com um pedaço de papel alumínio (ou papel filme) e transfira pra geladeira. Deixe gelar por pelo menos 2 horas antes de servir. Rende 6 mini pavês (uso copinhos de 100ml).

*Pequena correção: esqueci de especificar que o papel filme tem que ficar diretamente em contato com o creme pra impedir que uma nata se forme.

12 comentários em “Sobremesa sem desculpas

  1. espero conseguir criar meus filhos com pouco açúcar para eles não sofrerem como eu…. Tá bonito o doce!
    E eu não sabia que existia baunilha em favo. Aliás, parando para pensar eu não sei o que é baunilha… Só coisa artificial…

    1. Nunca é tarde demais pra acabar com um vício, colega. Ainda mais um vício que faz tanto mal como o açúcar. Eu sabia da existência de favos de baunilha há tempos, mas só vi um ao vivo ano passado. Esse natal tive a imensa sorte de receber dois pacotinhos de baunilha de presente: um do amigo Welder e outro da minha cunhada que mora pertinho de Madagascar (um dos maiores produtores de baunilha).

  2. Eu, como uma típica brasileira das que vc descreve, gostei bastante da sua sobremesa. E olhe que sou fã de tudo preto, ou seja, com bastante chocolate, creme de leite e leite condensado, mas irei fazer usa receita ultra levinha viu?!
    Acho q minha mãe vai adorar. Vou fazer pra ela.

    1. Sei que seu gosto é tipicamente brasileiro e os anos nos States não devem ter ajudado a mudar isso, né? Parece que a situação por lá é ainda pior: tudo é tão doce quanto no Brasil e ainda por cima com uma boa dose de sal. Mas tenho certeza que minha (nossa) mãe vai gostar. Use o leite de soja em pó dela que vai ficar lindo. E se não tiver rum, uma cachacinha envelhecida (tipo “Gabriela”) dá muito certo também.

    1. Cida, como eu expliquei na receita, o sabor do coco é bem suave, quase imperceptível. Não espere um pavê de coco e sim um pavê de baunilha e banana. Se realmente quiser um sabor mais intenso, use 1x de leite de soja e 2/3x de leite de coco, mas não sei como vai ficar a harmonia de sabores no final pois nunca testei com essas proporções. Será por sua conta e risco 🙂

  3. So pra me intrometer um pouco, e respondendo a Mona, como não moramos no velho mundo, vc pode adquirir baunilha em fava pelo http://www.ebay.com, é totalmente diferente daquela essencia yoki, e como é de se esperar, deixa um aroma delicioso nos doces. #ficaadica. Nem só de leite condensado vive o Brasil =P kkkkkkkkkkkkkkk

  4. Não Sandra, viver sem ele ainda não dá, afinal, fomos nós que criamos o brigadeiro, mas como tenho um compadre chef e ja fiz alguns cursos de sobremesas, sei q elas vão além do velho pavê de biscoito champanhe, com leite “moça” é claro. E ainda respondendo a Mona, esse meu amigo vende baunilha em fava que ele importa, não é caro, pode entrar em contato com ele no http://www.pratoperfeito.blogspot.com, vc conhece ele, é o Angelo. Bj

    1. Sim, conheço virtualmente Angelo (graças a você) e de vez em quando visito o blog dele. Você precisa dar um curso pro pessoal da minha familia. Acho que a obsessão deles por leite condensado me traumatizou 🙁

  5. Sandra, essa receita tem feito parte dos meus sonhos!
    Mas estou com uma dúvida: o leite de coco de lata é diferente do de garrafa?

    Parabéns pelo blog, e por abraçar tantas causas de maneira tão bonita.
    Aliás, você foi uma das responsáveis por minha transição (já completa) do ovl-vegetarianismo para o veganismo. Obrigada.

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